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Nos municípios, a agenda é nacional: Covid-19 protagoniza debate eleitoral no Twitter

Atualizado em 16 de novembro, 2020 às 6:48 pm

  • No último mês, do fim de agosto até esta segunda-feira (28 de setembro), a FGV DAPP identificou mais de 3,5 milhões de menções no Twitter às disputas municipais no país;
  • No entanto, ao contrário de agendas próprias de prefeituras, como educação, saúde, habitação e gestão urbana, o presidente Jair Bolsonaro e a polarização política sobre o combate à Covid-19 são os principais destaques da discussão pública — e há até referências às eleições dos Estados Unidos e ao presidente Donald Trump;
  • Nas capitais, o mesmo padrão se repete: denúncias contra Marcello Crivella (e o potencial apoio de Bolsonaro) dominam o debate carioca, enquanto, em São Paulo, as campanhas de Joice Hasselmann, Celso Russomanno e Orlando Silva estão diretamente associadas à conjuntura federal, e não ao contexto próprio paulistano;

As pesquisas eleitorais e os programas de campanha de candidatos a prefeito sempre indicam, às vésperas de disputas municipais, que o eleitorado adota posição pragmática sobre os assuntos e pautas de maior importância, com enfoque em problemas locais com mobilidade urbana, gestão urbana, coleta de lixo e, sobretudo, saúde e educação. Mas, conforme monitoramento da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV DAPP), o atual cenário eleitoral é, nas redes sociais, dominado pelo debate polarizado nacional, a partir da figura do presidente Jair Bolsonaro e da atuação do governo federal quanto à pandemia de Covid-19.

Ao longo do último mês, entre 25 de agosto e 28 de setembro, houve a identificação de 3,6 milhões de menções no Twitter sobre a próxima corrida eleitoral relacionada a diferentes pautas de política pública no Brasil, de sustentabilidade ao retorno de escolas. E, como exibe a nuvem de palavras abaixo, grande parte do debate se organiza de forma central a partir da figura de Bolsonaro e, em menor escala, de outros atores da agenda nacional, como o ​ex-presidente Lula e o ​presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia​.

Na nuvem, questões alheias ao escopo de atuação de prefeitos são predominantes: STF, os incêndios na Amazônia e no Pantanal, a preservação da democracia no Brasil e, inclusive, a disputa eleitoral nos Estados Unidos — com muitas menções ao presidente Donald Trump. As escolas municipais, as unidades de atenção básica de saúde, as linhas de ônibus e a falta de iluminação pública ainda não apareceram na agenda digital dos grupos políticos na rede — que apenas ganha contorno regionalizado a partir de denúncias de corrupção.

Muitas postagens buscam deixar registrada a opinião e a atuação de alguns políticos com relação, por exemplo, ao incentivo à flexibilização da quarentena e à reabertura do comércio e a propostas da equipe econômica para o auxílio emergencial, o fundo eleitoral e a reforma administrativa. Esse debate enfoca, ainda, o posicionamento dos candidatos diante de recomendações de autoridades sanitárias ‒ como o uso de máscaras, o isolamento social e a hidroxicloroquina ‒, além de outras pautas mais amplas, como a preservação do meio ambiente e demandas dos movimentos negro e feminista e da comunidade LGBTQIA+.

Rio e São Paulo já têm acelerado debate eleitoral

No que se refere às eleições em São Paulo, que responderam por 556 mil postagens no Twitter, o debate é marcado por reações à divulgação de pré-candidaturas específicas — e não exatamente de chapas com bons resultados em pesquisas de opinião. O anúncio da pré-candidatura da deputada federal @joicehasselmann (PSL) gerou o maior fluxo de críticas, sobretudo à direita: a base alinhada a Bolsonaro afirma já descartar a parlamentar como opção para a prefeitura com a acusação de que está somente interessada no fundo eleitoral. Muitas postagens ameaçam boicotar, ainda, @celsorussomano (Republicanos), caso o deputado federal não interceda pela votação do auxílio emergencial na Câmara dos Deputados; e de @orlandosilva (PCdoB), por uma proposta legislativa de autoria do parlamentar para o combate às fake news.

Quanto às eleições no Rio de Janeiro, que somaram 425,2 mil menções no Twitter, destacam-se comentários a respeito de @MCrivella (Republicanos). As reportagens sobre os “guardiões do Crivella” impactaram negativamente a opinião das redes sobre a pré-candidatura do atual prefeito. A participação de Crivella na corrida eleitoral é questionada, também, diante de acusações de desvio de verbas da Saúde, destinadas ao combate do novo coronavírus na cidade do Rio — e, por isso, o atual prefeito é protagonista central de oposição por diferentes grupos e bases políticas, da direita à esquerda, enquanto outras candidaturas, como as de Eduardo Paes e Martha Rocha, estão mobilizando baixo engajamento.

Em Recife e Manaus, PT é destaque, e em Salvador base pró-Bolsonaro ataca o DEM

Em outras capitais do país, ao contrário do já aquecido contexto político nas duas maiores cidades do Brasil, o debate sobre as eleições ainda é baixo e sem agendas organizadoras da discussão. Sem protagonismo nas disputas em Rio e São Paulo, contudo, o PT é destaque na esfera digital de Recife (82,4 mil menções no período), a partir do anúncio da  pré-candidatura de @MariliaArraes (PT), em aliança com PSOL, como a principal alternativa contra candidatos do município com orientação bolsonarista. 

Perfis de apoio ao partido estão em atividade digital ainda em Manaus (4,6 mil tuítes), cujo debate sobre as eleições é igualmente baixo até o momento. Os poucos momentos de engajamento aquecido na cidade são repercussões da candidatura de José Ricardo, que faz chapa com vice indicado pelo PSOL e recebeu apoio de Lula. Outro foco de debate regional foi declaração de Bolsonaro, em 24 de setembro, afirmando que já definiu candidatos de apoio na capital amazonense, em Santos e em São Paulo, mas não os revelou.

Já em Salvador (10 mil postagens), cuja pauta eleitoral no Twitter se organiza a partir de datas específicas de forte atuação política, a polarização nacional se faz evidente, mas com destaque a grupos alinhados ao presidente e que repercutem oposição ao DEM e à base do atual prefeito ACM Neto. Ao longo da última semana, a partir de 25 de setembro, referências à candidatura do PT local começaram a aparecer, na chapa da Major Denice, e que se organizam, da mesma forma, a partir da polarização com Bolsonaro. É o único momento em que há sinal de uma agenda de política pública na esfera das redes sociais, em função de comentários sobre a associação do petismo com as polícias e a pauta de segurança pública. Alguns perfis à direita iniciaram ainda a divulgação da campanha de Cezar Leite (PRTB), associando-o diretamente a um suposto apoio do presidente e pela defesa de valores conservadores e ao antipetismo.