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Entre escândalos e conspirações, associação com violência e criminalidade tem forte crescimento no debate sobre presidenciáveis

Atualizado em 25 de julho, 2022 às 3:52 pm

  • A partir de junho, Lula e Bolsonaro apresentam alta na associação com o tema, que chega a ocupar mais de 20% das menções em junho;
  • Tema central no último ciclo eleitoral, corrupção vai progressivamente sendo substituída pelo debate sobre criminalidade e violência em 2022;
  • Enquanto Bolsonaro é pressionado por escândalos de corrupção e acusações de incentivo à violência política; ataques a Lula migram de denúncias de corrupção, para tentativa de associação com facções criminosas.

Debate sobre violência e criminalidade desbanca corrupção e desponta como tema central no debate eleitoral de 2022. É o que mostra análise produzida pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV DAPP), que entre 1º de janeiro e 18 de julho de 2022, observou, por diferentes ângulos, o debate sobre segurança nas menções às eleições e aos presidenciáveis.

Análise se divide em cinco frentes: 1) no mapa de interações, busca identificar o tamanho e discurso dos campos políticos no debate sobre violência e criminalidade no Twitter; 2) um gráfico de evolução e barras analisa a evolução de menções a subtemas de segurança, identificando o crescimento do debate sobre violência e criminalidade a partir de junho; 3) em seguida, é realizada uma análise de associação dos presidenciáveis com o debate sobre violência e criminalidade, registrando o aumento expressivo da relação nas menções a Lula e Bolsonaro; 4) esse resultado leva a um aprofundamento em relação aos discursos associados aos líderes das pesquisas, em nuvens de palavras que buscam capturar as variações discursivas da associação desde o início do ano; 5) por fim, é realizada uma análise dos links com mais interações sobre esse debate no Facebook em diferentes períodos do ano.

Twitter

 

Mapa de interações do debate violência/criminalidade no debate sobre presidenciáveis no Twitter
Período: 1º de maio a 18 de julho de 2022

Fonte: Twitter | Elaboração: FGV DAPP

Esquerda ‒ 43,26% dos perfis | 40,85% das interações
Movimentado por perfis de blogueiros, canais de entretenimento e de políticos da esquerda, com destaque para o perfil do presidenciável @LulaOficial, esse grupo reverbera – em tom de denúncia e indignação — as mortes do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, por defenderem o território indígena e a Amazônia, e a morte do tesoureiro do PT, Marcelo Arruda, que foi assassinado pelo agente penal Jorge Garanho, apoiador do presidente Jair Bolsonaro. Além disso, as postagens trazem uma vasta lista de crimes, evidenciando o presidente Bolsonaro como principal motivador das ações ilícitas. Tais postagens denominam de “ocultação de crime” o sigilo do cartão de vacina e do cartão corporativo, do encontro com pastores e o processo de asfixia do Genivaldo. As mensagens na plataforma, ainda, denunciam a base governista, com ênfase em Carla Zambelli e Jorginho Mello, por estarem envolvidos em esquemas criminosos ligados ao PCC, e essa suposta participação está sendo chamada pelas postagens de “máfia da Amazônia” e “bancada do crime”.

Direita ‒ 43,08% dos perfis | 53,22% das interações
Impulsionado pelo perfil do presidenciável @jairbolsonaro e por jornalistas, blogueiros e influenciadores conservadores, grupo se concentra em exaltar os feitos policiais — citando BOPE, @PMERJ e @policiafederal — e divulgar supostos recordes de redução de homicídios, crimes violentos e de apreensão de drogas. As postagens também responsabilizam a esquerda – e fazem menções ao ex-presidente Lula – por apoiar bandidos e o narcotráfico, por desprezar as leis e as vítimas, por demonizar os policiais. As mensagens, ainda, lamentam algumas supostas lacunas na constituição brasileira, apontando para punições mais rígidas – como, por exemplo, prisão perpétua – para crimes contra crianças. Além disso, várias postagens se manifestam contra o aborto e divulgam informações sobre a suposta relação entre o PT e o PCC.

Terceira via ‒ 6,24% dos perfis | 3,57% das interações
Agitado por perfis de canais de mídia alternativa e por políticos que sinalizam uma terceira via, como o perfil de @cirogomes, esse grupo repercute supostas ações ilegais dos presidenciáveis Lula e Bolsonaro. Evidenciando a declaração de Lula durante evento em Maceió, na qual o presidente assevera que havia procurado Renan Calheiro e Fernando Henrique Cardoso para libertar sequestradores de Abílio Diniz da prisão, as postagens criticam essa ação do ex-presidente e enfatizam a narrativa de que Lula e o PT ou estão envolvidos em crimes ou estão protegendo os criminosos. No que se refere ao presidenciável Jair Bolsonaro, postagens salientam que o presidente brasileiro possivelmente tenha cometido inúmeros crimes de responsabilidade, sendo necessário procurar medidas legais para destituí-lo do cargo da presidência da república. No entanto, as postagens chamam atenção para o fato de que a presença de Arthur Lira, o presidente da Câmara, potencialmente, atravancaria o andamento do pedido de impeachment.

 

Principais tuítes por grupo no debate sobre violência/criminalidade e presidenciáveis
Período: 09 e 10 de julho de 2022

Fonte: Twitter | Elaboração: FGV DAPP

 

Evolução de subtemas de segurança no debate sobre eleições no Twitter
Período: 1º de janeiro a 18 de julho de 2022

Fonte: Twitter | Elaboração: FGV DAPP

 

  • Predominante em todo o período entre os subtemas de segurança, o debate sobre violência/criminalidade registrou um aumento de mais de 50% no volume de menções e o alargamento da distância para outros temas a partir do mês de junho;
  • O aumento no debate sobre violência/criminalidade esteve fortemente associado à mobilização entre perfis de apoio a Bolsonaro, que direcionaram críticas e repercutiram declarações do ex-presidente Lula sobre sua participação nas negociações para a soltura do empresário Abílio Diniz, em sequestro ocorrido em 1989. O caso iniciou um movimento de associação do Partido dos Trabalhadores com a facção criminosa PCC, que foi complementado por lembranças sobre o caso da morte do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel, e pela reportagem da revista Veja que revelou um trecho da delação de Marcos Valério, em que o empresário afirma que o partido e a facção mantém relações próximas. O governo, por sua vez, também impulsionou o crescimento do tema, com as denúncias de crimes envolvendo o ex-ministro da educação, Milton Ribeiro, e o ex-presidente da Caixa Pedro Guimarães;
  • Tema de grande impacto na política nacional ao menos desde a operação Lava-Jato, a corrupção é apenas o terceiro subtema mais relevante no debate sobre segurança nas eleições. Nos primeiros meses do ano, o tema somente ultrapassou o debate sobre forças de segurança em março;
  • O debate sobre forças de segurança, por sua vez, apresenta forte associação com investigações da Polícia Federal contra o presidente Jair Bolsonaro e com a presença das forças armadas no debate sobre desconfiança eleitoral;
  • Chama a atenção o baixíssimo volume do debate sobre políticas públicas de segurança. As poucas menções ao tema sugerem que o debate sobre segurança se organizou de forma prioritariamente conflitiva, sem espaço para a construção de um debate substantivo sobre os programas e propostas de governo dos presidenciáveis.

 

Associação de presidenciáveis com o debate sobre violência/criminalidade
Período: 1º de janeiro a 18 de julho de 2022

Fonte: Twitter | Elaboração: FGV DAPP

 

  • A associação dos presidenciáveis ao debate sobre violência/criminalidade segue estável no primeiro semestre de 2022 e cresce a partir de junho, com o acirramento da disputa política. O presidente Jair Bolsonaro tem maior associação até o mês de maio, mas inverte posição com o ex-presidente Lula em junho. Bolsonaro é associado a milícias, as mortes por covid-19, crimes de prevaricação e corrupção e declarações favoráveis ao uso de armas. Em junho e julho, quando as associações aumentam, destacam-se postagens de usuários responsabilizando o presidente pelo assassinato de Bruno Pereira e Dom Phillips, do petista Marcelo Arruda e denúncias contra membros do governo federal, como Pedro Guimarães e Milton Ribeiro. Declarações feitas pelo presidente e seus apoiadores ligando o presidenciável Lula ao narcotráfico, PCC e ao assassinato de Celso Daniel também se destacam nas associações;
  • Durante o primeiro semestre do ano, as associações do ex-presidente Lula ao debate sobre violência/criminalidade estão relacionadas a escândalos de corrupção e críticas afirmando que Lula defende bandidos, legalização do aborto e liberação das drogas. Em junho, o ex-presidente ultrapassou Bolsonaro, impulsionado por uma declaração do próprio Lula sobre o sequestro de Abílio Diniz e por denúncias divulgadas na imprensa e nas redes sociais que ligam Lula ao assasinato de Celso Daniel e ao PCC. Em junho, o debate sobre criminalidade associado ao ex-presidente segue em crescimento, com destaque para postagens que relacionam o ex-presidente com o PCC e que criticam ao ministro Alexandre de Moraes e a imprensa, que estariam escondendo o fato essa relação do PT com o narcotráfico na América Latina;
  • Os presidenciáveis Ciro Gomes, Simone Tebet e André Janones também mantêm uma associação estável e que acompanha o volume do debate de violência/criminalidade. O debate associado a Ciro Gomes é focado em comparações que seus apoiadores fazem com Bolsonaro e Lula; Simone Tebet e André Janones se destacam no debate através da atuação no Congresso Nacional.

 

Nuvem de palavras do debate sobre violência/criminalidade associado a Lula
Período: 1º de janeiro a 18 de julho de 2022

Jan-Mar

Abr-Jul

Fonte: Twitter | Elaboração: FGV DAPP

 

  • Denúncias que ligam o ex-presidente Lula à corrupção foram os temas principais do debate sobre violência/criminalidade associado ao presidenciável entre janeiro e março. Os usuários falam sobre esquemas de corrupção nos governos petistas, denúncias de lavagem de dinheiro e organização criminosa envolvendo o advogado de Lula e repercutem uma fala do presidente Jair Bolsonaro dizendo que Lula quer “voltar à cena do crime” através das eleições presidenciais. Entre abril e julho a associação do petista com a corrupção diminui e mesmo os termos lavagem de dinheiro e cena do crime estão mais associados a denúncias que associam o ex-presidente ao narcotráfico e ao crime organizado;
  • A associação entre Lula e o crime organizado ganha força entre abril e julho, após o antigo contador de Lula ser investigado por lavagem de dinheiro para o PCC; uma delação de Marcos Valério que liga o presidente ao PCC e a morte de Celso Daniel; e de declarações de Lula dizendo que pediu para Fernando Henrique Cardoso e Renan Calheiros para que os sequestradores de Abílio Diniz fossem liberados da prisão. No início do ano já é possível observar a associação do ex-presidente com o assassinato de Celso Daniel feita a partir de uma fala do presidente Jair Bolsonaro sobre o tema; no segundo semestre a associação do petista com o crime organizado se torna o tema principal do debate;
  • A associação de Lula ao judiciário também sofre alterações entre os dois períodos analisados. Entre janeiro e março a Justiça brasileira é criticada por decisões que favorecem o ex-presidente em processos relacionados à Lava Jato; entre abril e julho, as críticas se concentram no ministro Alexandre de Moraes, por decisões contrárias ao presidente Bolsonaro e que, portanto, poderiam favorecer Lula. O principal destaque dessas críticas ao ministro é relacionada à decisão que pede que deputados bolsonaristas retirem postagens que relacionam Lula ao PCC.

 

Nuvem de palavras do debate sobre violência/criminalidade associado a Jair Bolsonaro
Período: 1º de janeiro a 18 de julho de 2022

Jan-Mar

Abr-Jul

Fonte: Twitter | Elaboração: FGV DAPP

 

  • O ministro Alexandre Moraes foi alvo de críticas entre janeiro e março, por investigar o presidente Bolsonaro por divulgar informações sigilosas e notícias falsas. Os seguidores do presidente acusaram o ministro de aparelhar a Polícia Federal e afirmaram que Bolsonaro não cometeu crime; entre abril e julho Alexandre Moraes segue associado ao presidente por suas decisões contra fake news e desinformação nas eleições e pela ação movida pelo presidente contra o ministro por abuso de autoridade. O pedido para que sejam retiradas as postagens que relacionam Lula com o PCC também são alvo de críticas dos bolsonaristas, que afirmam que o ministro faz parte dessa “quadrilha” e está do lado do ex-presidente petista;
  • A associação do presidente Jair Bolsonaro ao assassinato de lideranças políticas e ativistas também tem destaque nos dois períodos. Entre janeiro e abril, críticos do presidente organizaram uma ação online afirmando que ele mandou matar Marielle Franco e relembram o caso, nesse período, os apoiadores do presidente também questionaram que mandou matar Bolsonaro, fazendo referência a facada durante a campanha de 2018; entre abril e julho as referências a Marielle Franco e a facada continuam em destaque, mas o presidente também passa a ser responsabilizado de forma indireta pela morte de Dom e Bruno;
  • O assassinato do petista Marcelo Arruda por um policial bolsonarista, em Foz do Iguaçu, também teve grande destaque no debate sobre criminalidade/violência associado ao presidente Jair Bolsonaro entre abril e julho. Declarações do presidente foram recuperadas e utilizadas pelos usuários para dizer que Bolsonaro incita a violência e defenderam que o crime teve motivações políticas. O presidente ainda foi acusado de ter se aproveitado de uma conversa com a família para se promover.

 

Facebook

 

Principais links do debate sobre violência/criminalidade associado a presidenciáveis no Facebook
Período: 1º de janeiro a 18 de julho de 2022

Fonte: Facebook | Elaboração: FGV DAPP

 

  • Entre os principais links sobre violência/criminalidade e presidenciáveis no Facebook, destaca-se a forte presença do veículo de mídia alternativa de direita, Jornal da Cidade Online. Na divisão em períodos do ano, nota-se que o veículo ocupou as primeiras posições em volume de engajamento nos seis primeiros meses do ano, o que é um demonstrativo da capacidade do campo de direita em construir narrativas sobre o tema em momentos de menor discussão no debate público mais amplo;
  • A análise de links no Facebook corrobora a transição observada na análise de nuvem de palavras, com a predominância de associações entre o PT e corrupção nos primeiros meses do ano e a transição para a relação com facções criminosas entre junho e julho;
  • É interessante notar que as notícias negativas para o governo são fruto de ações, processos e fatos ocorridos ou descobertos em 2022. Ou seja, tratam-se de casos “quentes” que se impuseram no debate público e pressionaram o governo, como a ordem do STF para que Bolsonaro depusesse à Polícia Federal, no início do ano; o assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips; e as repercussões da morte do tesoureiro do PT, Marcelo de Arruda, por um apoiador de Bolsonaro, em julho;
  • Entre notícias negativas para o PT, por sua vez, destacam-se fatos e eventos de maior temporalidade, como acusações de corrupção em governo anteriores; suspeitas de ações criminosas nos casos de Abílio Diniz e Celso Daniel; e denúncias de suposta associação criminosa a partir do vazamento de trechos da delação do empresário Marcos Valério, ocorrida em 2017. Ou seja, a despeito de, por diferentes motivos, os fatos voltarem a serem circulados na imprensa, as pressões e acusações contra o PT remetem a um acúmulo de críticas ao longo de anos, que se intensifica próximo às eleições de 2022 apoiado na grande capacidade de mobilização e engajamento do campo ligado a Jair Bolsonaro no debate digital;
  • O peso de acontecimentos de grande clamor popular, no entanto, é capaz de superar o engajamento gerado pelas bem sucedidas campanhas promovidas por setores mais à direita, como pode ser observado na predominância de notícias sobre o assassinato ocorrido em Foz do Iguaçu-PR, no mês de julho.