Eleições 2020: Denúncia contra Daniel Mora causou a maior controvérsia sobre violência de gênero no Twitter
Uma análise para a nossa Sala de Democracia Digital estabeleceu que o caso de violência relatado pela esposa do candidato gerou um dos picos controversos da campanha
Por Gianella Tapullima
Atualizado em 7 de fevereiro, 2020 às 4:11 pm
Nos últimos dias da corrida eleitoral, os principais líderes do Partido Morado (Partido Roxo) foram criticados por protagonizarem dois eventos controversos: uma denúncia por violência familiar e um incêndio confuso no distrito de Miraflores. O OjoPúblico analisou o debate no Twitter em torno desses casos, que apontam para o candidato Daniel Mora e o líder do partido Julio Guzmán, e estabeleceu que, como resultado desses casos, ambos os personagens geraram um total de 316 mil interações, em picos de impacto nas redes ao longo da campanha eleitoral. O principal estava relacionado com a discussão sobre a violência de gênero.
Essa análise, realizada através da ferramenta de monitoramento do Trendsmap, permitiu captar um universo de 283.800 interações (tuítes, retuítes e respostas) associadas à discussão no Twitter sobre violência contra a mulher, a partir de 3 de dezembro de 2019 – data limite para publicação das listas de candidatos nesse processo – até 20 de janeiro de 2020. Esta é uma amostra que incluiu tópicos sobre abuso sexual, agressão, feminicídio e outros crimes contra mulheres, que foram registrados nos últimos meses.
Em relação a este período, a denúncia por abuso familiar feita contra o ex-candidato ao Congresso Daniel Mora, a cobertura do feminicídio de Jessica Tejeda; e as críticas contra a Ministra da Mulher, Gloria Montenegro, por suas declarações sobre os alarmantes números da violência sexual, foram os marcos da discussão das redes sociais sobre o tema, segundo a pesquisa realizada para a Sala de Democracia Digital, iniciativa regional para monitorar o debate público nas redes sociais na América Latina, promovida pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas, do Brasil, em parceria com o Chequeado, na Argentina; o Linterna Verde na Colômbia e o OjoPúblico no Peru.
Contudo, a controvérsia desencadeada pela denúncia de violência feita contra Daniel Mora foi proporcionalmente maior do que a gerada pelos outros eventos. Na última quinta-feira, 16 de janeiro, a acusação feita pela esposa de Mora gerou 53.200 interações no Twitter em um único dia. Este número foi mais de 12 vezes o número de interações registradas no mesmo período devido à notícia do feminicídio de Jessica Tejeda (4.300, em 22 de dezembro), uma mulher assassinada com seus três filhos por seu então parceiro no distrito de Agustino.
ANORAMA. Na última quinta-feira, 16 de janeiro, ocorreu o ponto alto da discussão sobre a violência contra a mulher após a apresentação de uma denúncia por violência familiar contra o ex-ministro Daniel Mora.
Visualização: OjoPúblico via Brandwatch
Vale lembrar que, naquela época, um pico de discussão surgiu quando a Ministra da Justiça, Ana Teresa Revilla, preferiu não fazer declarações sobre aquela tragédia no meio da celebração do Natal. Essa reação corresponde a um dado não menor: o ano de 2019 fechou com 167 feminicídios, a maior taxa da última década, segundo o Ministério da Mulher.
Segundo a análise do OjoPúblico, o caso de Mora foi discutido oito vezes mais do que a controvérsia que surgiu quando a ministra da Mulher e Populações Vulneráveis, Gloria Montenegro, usou a frase “Peru, país dos estupradores”. A discussão sobre esta última expressão atingiu um pico de 6.500 interações em 10 de janeiro de 2020.
Até o momento da denúncia, o partido Solidaridad Nacional (Solidariedade Nacional) teve o principal pico de reações geradas por uma controvérsia na campanha do Congresso de 2020, com 64.200 interações em um único dia, provocadas pelo gesto de conotação racista do candidato Mario Bryce contra o candidato Julio Arbizu.
Eleições 2020: Polêmicas do Partido Morado
Em pouco mais de uma semana, as interações sobre dois eventos controversos do Partido Morado superaram o debate sobre racismo envolvendo o partido Solidaridad Nacional e Juntos por el Perú (Juntos pelo Peru).
O OjoPúblico realizou uma análise específica do caso de Daniel Mora com a ferramenta Trendsmap e descobriu que a denúncia de sua esposa gerou um total de 203.200 interações entre 15 e 20 de janeiro de 2020. O monitoramento da rede mostrou que o primeiro tuíte sobre o assunto foi publicado na noite de quarta-feira, 15 de Janeiro, pelo candidato Javier Pacheco do partido Solidaridad Nacional. Pacheco foi um dos sujeitos a um processo de sanção pelo Juizado Nacional Eleitoral (JNE) por transmitir o questionado vídeo do seu partido no qual apresentou vários dos seus rivais políticos juntamente com elementos terroristas.
Na manhã seguinte, a denúncia foi publicada pelo candidato da APRA José Pimentel, que apareceu em programas de televisão com a proposta de revogação das resoluções da Sunedu (Superintendência Nacional do Ensino Superior Universitário) sobre licenciamento de universidades, um tema promovido especialmente por Mora.
Nas horas seguintes, a denúncia começou a se espalhar com maior impacto e alcance através das contas de pessoas de agrupamentos políticos na corrida eleitoral como o Partido Aprista, Solidaridad Nacional e Contigo, bem como de reportagens na mídia.
Por meio das ferramentas Trendsmap e Gephi, o OjoPúblico identificou que durante esse período foram formadas duas comunidades que rejeitaram e questionaram a denúncia contra Daniel Mora. Uma análise das principais autoridades de cada grupo (como são chamados os usuários mais retuitados) mostra que um setor utilizou a crítica e outro o ataque para se referir à questão. Este último, de acordo com a comparação estatística, teve uma maior quantidade de conteúdo compartilhado (retuítes) de 15 a 20 de janeiro de 2020.
FILTRAGEM. Na noite de 15 de janeiro, o candidato ao Congresso pelo Solidaridad Nacional publicou a acusação de agressão contra o ex-ministro Daniel Mora.
Foto: captura da conta de Javier Pacheco no Twitter
Na sexta-feira, 17 de janeiro, o ex-ministro Daniel Mora foi entrevistado no RPP Noticias, a fim de responder às acusações contra ele. Como parte de sua defesa, ele disse que era um assunto de família, negou ter agredido sua esposa e chamou Julio Guzmán de desleal, por causa das declarações do Partido Morado exigindo sua exclusão da corrida eleitoral. Um total de 43.900 interações foram observadas naquele dia. As mulheres responderam por 28% da discussão e os homens por 72%.
Dois dias depois, na noite de domingo, 19 de janeiro, a esposa de Daniel Mora ratificou sua denúncia em todos os seus aspectos. “Não estou procurando ferir ninguém, mas estou no meu direito de declarar que tudo o que disse no meu manifesto é verdade”, disse ela a um programa de notícias. O pronunciamento atingiu um pico de 27.300 interações.
Por causa destes fatos, Mora foi esta semana à 3ª Procuradoria Geral da República, especializada em crimes de violência contra a mulher, como parte de uma investigação preliminar. Mais tarde, deu uma entrevista na qual evitou descartar se assumiria o cargo no caso de uma eleição como congressista.
Na última sexta-feira, o caso do candidato se complicou com a publicação de um pedido de paternidade contra ele. Através de sua conta oficial no Twitter, que ele manteve suspensa por vários dias, Daniel Mora respondeu que esta é uma invenção de um setor da imprensa para prejudicá-lo. Até o fechamento desta edição, este novo incidente havia gerado 3.400 interações na rede social.
Caso Julio Guzmán
No último domingo, o noticiário Panorama transmitiu um vídeo no qual o líder do Partido Morado apareceu fugindo de um incêndio dentro de um prédio onde almoçava com um membro do seu partido. Enquanto essa reportagem estava sendo transmitida, Julio Guzmán foi simultaneamente entrevistado em outro programa para dar seu parecer. A divulgação e a resposta das pessoas envolvidas produziram um total de 69.700 interações sobre o tema entre 19 e 20 de janeiro de 2020, período em que se manteve como tendência no Twitter. Em um único dia, o incidente gerou 22.700 interações com comentários satíricos, ataques e questionamentos.
De acordo com os dados analisados com as ferramentas Trendsmap e Gephi, a discussão do caso dividiu os comentaristas do Twitter em pelo menos três comunidades principais: a primeira reuniu 31,81% dos usuários; a segunda, 38,70% dos usuários; e a terceira reunia 23,31% dos usuários.
REDES. Após o incidente protagonizado por Julio Guzmán, foram formadas três comunidades no Twitter que publicaram comentários satíricos, ataques e questionamentos.
Visualização: OjoPúblico via Gephi / Fonte_ Trendsmap
O incidente de Julio Guzmán colocou seu partido no centro de um furacão. Segundo o Trendsmap, entre segunda-feira, 13 de janeiro e segunda-feira, 20 de janeiro, o agrupamento político gerou um total de 316 mil interações por episódios que vão desde a polêmica declaração de Guzmán sobre supostos grupos “feministas extremistas” até sua notória ausência na coletiva de imprensa em que seu partido emitiria a posição oficial sobre a denúncia de violência contra Daniel Mora. Em seu lugar, o secretário-geral do Partido Morado, Rodolfo Pérez, declarou que o grupo desconhecia essas acusações e exigiu publicamente a demissão de Mora.
Precisamente, um dos últimos pronunciamentos de Guzmán no Twitter foi exigir a renúncia e a exclusão do ex-ministro Daniel Mora, mas ele não emitiu nenhum parecer sobre o seu próprio caso.
Por outro lado, o presidente do Juizado Especial Eleitoral (JEE), Luis Carrasco, disse que o Partido Morado não apresentou devidamente o pedido de renúncia de Daniel Mora. Num diálogo com a RPPNoticias, ele disse que o partido não cumpriu com a anexação da ata corretamente para oficializar este pedido. Nesse sentido, o ex-candidato Daniel Mora também não formalizou a sua renúncia perante o Juizado Nacional Eleitoral. Em outras palavras, ele ainda está na corrida para as eleições deste domingo para o Congresso.
*A Sala de Democracia Digital é uma ação da FGV DAPP, em parceria com Chequeado, na Argentina, Linterna Verde, na Colômbia e Ojo Público, no Peru. Nós monitoramos o debate público nas redes sociais pela América Latina.
A análise original está disponível no site do Ojo Público aqui.