O outro salto da Frepap: da campanha de baixa intensidade para o turbilhão das redes sociais
A análise da Sala de Democracia Digital indica que o agrupamento político aumentou sua visibilidade no Twitter em mais de 500% em um único dia após os resultados preliminares das eleições de 2020, que o colocaram entre os mais votados
Por Carla Díaz
Atualizado em 14 de fevereiro, 2020 às 11:23 am
Após uma campanha política contracorrente centrada nas redes físicas, a Frente Popular Agrícola do Peru (Frepap), a segunda força no novo Congresso – com base em 99,09% das atas processadas e 85,82% das atas contabilizadas – avalia sua incursão oficial nas redes sociais do mundo digital, enquanto um turbilhão de contas apócrifas disputa sua representação. A aparente desordem poderia evidenciar discrepâncias internas, segundo versões coletadas pelo OjoPúblico para a Sala de Democracia Digital. Depois de conhecidos os resultados preliminares no último domingo, as referências a este agrupamento no Twitter aumentaram mais de 500% no dia da votação, em comparação com as referências que ocorreram ao longo do processo que começou com a apresentação das listas no dia 18 de novembro.
De acordo com uma coleta de tuítes feitos através da ferramenta digital Brandwatch, que analisou uma amostra de 29% de um total de 1.279.889 publicações relativas a partidos políticos, a Frepap gerou apenas um total de 6.900 interações até 25 de janeiro. No entanto, no dia das eleições, 26 de janeiro, a discussão em torno do partido israelita aumentou cinco vezes, em exatamente 523%.
O aumento da discussão no Twitter sobre este partido teve três marcos importantes. Inicialmente, foi registrado um pico às 16h10 de 26 de janeiro, após a primeira pesquisa de opinião pública eleitoral da empresa de pesquisa Ipsos Perú, que colocou a Frepap como o grupo político com mais votos válidos (7%). Naquele momento, uma média de 1.056 tuítes foram gerados a cada 15 minutos, de acordo com os dados coletados com a ferramenta Trendsmap.
Um segundo momento chave ocorreu às 20h, após a transmissão da contagem rápida até 100% da Ipsos Perú, que deu à Frepap 8,9% dos votos válidos, tornando-se nessa altura a segunda força política na nova composição parlamentar. Os resultados elevaram o indicador para 2.276 tuítes a cada 15 minutos sobre o partido.
O terceiro grande debate sobre o agrupamento ocorreu no dia das eleições, às 22h. Ocorreu cinco minutos após a conta do Twitter @FrepapPeru, uma das contas que se intitulam porta-vozes do partido, publicar um tuíte criticando a comparação feita pela congressista virtual Martha Chávez sobre as semelhanças entre a Frepap e a Fuerza Popular (Força Popular). Esta publicação foi a mais retuitada no debate nas redes sobre a Frepap, com mais de 2.500 retuítes e 11.772 reações de ‘gosto’ até a noite de 27 de janeiro.
De acordo com a ferramenta Trendsmap, no auge da discussão foram produzidos 1.959 tuítes sobre o partido a cada 15 minutos, dos 80 mil tuítes feitos entre 26 e 27 de janeiro.
Deve-se notar que a conta @FrepapPeru foi recentemente criada no dia 26 de janeiro, no final do dia. 24 horas após sua criação e com menos de 25 tuítes feitos, este perfil obteve mais de 18 mil seguidores e de acordo com a plataforma Brandwatch, suas publicações obtiveram quase 3 mil retuítes em apenas um dia. No final desta análise, a conta já contava com mais de 21 mil seguidores. Embora alguns meios de comunicação atribuíssem esta conta ao partido político, com o passar das horas a sua autenticidade foi posta em dúvida.
“Não é uma conta oficial que possa derivar opiniões ou transmitir informações daqui da central”, explicou Susan Tineo Ccaccya, porta-voz da Frepap e secretária nacional da juventude desde agosto de 2019, conforme mencionado no site do Infogob.
A mudança do partido israelita para as redes sociais ocorreu em meio a um turbilhão de versões contraditórias sobre sua representação. Pelo menos cinco perfis no Twitter são identificados como contas supostamente oficiais da Frepap: @FrepapOficialPe, @FrepapO, @FREPAP_, @FrepapPerú, todas criadas no último mês. A mais antiga, @FREPAP1989, foi criada em maio de 2019.
Desse grupo, a conta @FREPAPPeru foi a mais retuitada e também a que teve mais respostas, de acordo com os dados identificados com o Trendsmap. Há também uma conta chamada @FREPAP_, que está listada como uma das 20 mais citadas.
Susan Tineo descartou que o partido tenha contas oficiais no Twitter ou Facebook e acrescentou que estavam investigando para descobrir a identidade das pessoas por trás da administração dessas contas. Tineo disse que estão atualmente coordenando o estabelecimento dos canais que usarão nas redes sociais para informar suas decisões partidárias.
Esta confusão virtual chega no momento mais esperado dos últimos vinte anos para o partido fundado por Ezequiel Ataucusi, em que os últimos dados da contagem oficial colocam o partido em segundo lugar entre as bancadas do novo período legislativo. Sobre isso, Jorge Acevedo Rojas, especialista em comunicação política e professor da Pontifícia Universidade Católica do Peru, explicou ao OjoPúblico que a falta de reação da Frepap à onda de contas que afirmam ser seus canais oficiais é uma debilidade em potencial, já que estas podem distorcer suas propostas e a identidade midiática do grupo.
Acevedo disse que isso poderia ser devido à escassa presença e experiência política da Frepap nos últimos anos, bem como ao fato de sua comunicação estar focada na construção de redes sociais físicas, comunidades e vínculos diretos.
“Pode ser um erro não se comunicar, não dialogar, não conhecer outros setores da mídia. Por outro lado, também é um erro distorcer a identidade ou os objetivos da Frepap, ou daqueles que possam chegar ao Congresso”, disse Acevedo, referindo-se às reações de analistas e jornalistas aos resultados obtidos por este grupo.
Para analisar a formação do debate sobre o retorno da Frepap ao Parlamento, o OjoPúblico extraiu dados do Twitter sobre o assunto e obteve um total de 80 mil interações entre tuítes e retuítes correspondentes somente aos dias 26 e 27 de janeiro. Estes dados foram processados com o programa Gephi, um software de visualização de redes, o que permitiu estabelecer que na discussão sobre o tema, 4 comunidades foram formadas.
COMUNIDADES. Assim foram formadas as comunidades que discutiram o tema da Frepap no Twitter: quatro grupos marcados com posições definidas.
Visualização: Gephi / Fonte: Dados extraídos do Twitter.
A primeira comunidade reuniu 16,3% de usuários (cor verde); o segundo grupo concentrou 16,54% (cor laranja); o terceiro setor reuniu a maior porcentagem de usuários, 53,24% e também aqueles que geraram mais conteúdo, 57,88% (cor roxa). O último grupo reuniu 13,91% dos usuários (cor fúcsia no gráfico), que mais frequentemente retuitaram a conta @FrepapPeru.
O OjoPúblico também entrou em contato com os administradores da conta @FrepapPeru para lhes pedir detalhes sobre a sua relação com o partido. Embora não tenham se identificado, os administradores indicaram por meio de uma mensagem direta: “Há uma questão interna e privada do partido que temos de resolver para tornar esta conta oficial”. Sem entrar em detalhes, o autor da mensagem disse que “as outras contas são completamente falsas e nenhum membro tem qualquer ligação com elas”.
Cabe destacar que com três dias de existência, o perfil do Twitter com mais impacto sobre a Frepap tem mais seguidores (21.900) do que as contas de alguns dos partidos que passaram a “valla electoral” (requisito que limita a participação de grupos políticos no Congresso que não atingem uma determinada porcentagem de votos) como o Acción Popular (Ação Popular, 8.578), Alianza Para el Progreso (Aliança para o Progresso, 7.013), Podemos Perú (Podemos Peru, 359) ou o Partido Morado (Partido Roxo, 6.209).
Esta é a terceira análise realizada pelo OjoPúblico como parte do projeto Sala de Democracia Digital, uma iniciativa regional para monitorar o debate público nas redes sociais na América Latina, promovido pelo Departamento de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas no Brasil, em parceria com o meio de comunicação argentino Chequeado e a organização colombiana Linterna Verde.
*A Sala de Democracia Digital é uma ação da FGV DAPP, em parceria com Chequeado, na Argentina, Linterna Verde, na Colômbia e Ojo Público, no Peru. Nós monitoramos o debate público nas redes sociais pela América Latina.
A análise original está disponível no site do Ojo Público aqui.