19 nov

#DebateEnRedes: O que foi discutido no Twitter em torno de Braian Gallo, presidente da mesa de Moreno que foi discriminado?

Por Ariel Riera, Celeste Gómez Wagner e Mariela García

Atualizado em 27 de dezembro, 2019 às 12:23 pm

Se você tem só alguns segundos, leia estas linhas:

  • O pico das interações coincidiu com a reunião do presidente eleito Alberto Fernández com o jovem.
  • A palavra “discriminação” esteve presente em 18% dos quase 200 mil tuítes ligados ao tema.
  • As duas mensagens mais retuitadas foram compartilhadas pelo presidente eleito da Frente de Todos.

Durante as eleições de 27 de outubro, foi viralizado um meme com uma mensagem discriminatória a um jovem que participou como fiscal de mesa do Colégio Nº 63 de Moreno. Se tratava de Braian Gallo, de 22 anos. Sua imagem se espalhou nas redes com legendas que ligavam sua aparência e vestuário a criminosos, e também o ligaram a uma possível fraude nas eleições.

Após as repercussões do caso, o jovem foi recebido em 30 de outubro pelo presidente eleito Alberto Fernández. Além disso, Magdalena Odarda, senadora nacional pela Frente de Todos da província de Río Negro, apresentou no mesmo dia uma denúncia relativa ao caso perante o Instituto Nacional contra a Discriminação, Xenofobia e Racismo (INADI), que está em tramitação, como confirmado a este meio de comunicação pelo instituto.

As mensagens discriminatórias, críticas e tuítes em defesa de Gallo se multiplicaram no Twitter. O Chequeado estudou, via Trendsmap (ferramenta que permite a análise de grandes quantidades de tuítes sobre um tema específico) as publicações compartilhadas de 27 de outubro às 8h, momento de abertura das eleições, até 7 de novembro ao meio-dia, quando foi publicado que o jovem conseguiu um emprego em uma fábrica de calçados em Moreno, na província de Buenos Aires.

Sobre isso, Braian confirmou a este meio de comunicação que não era ele, mas sua namorada que tinha entrado para trabalhar lá, e que a empresa a expulsou depois de três dias. Ele já fez os estudos preparatórios para começar a trabalhar em dezembro como garçom no refeitório do Ente Nacional Regulador del Gas (Enargas).

No período analisado, foram publicados 199.600 tuítes, registando um pico de compartilhamento na quarta-feira, 30 de outubro, às 13 horas, momento em que se realizou a reunião entre o presidente eleito e Gallo.

Interações no Twitter

Fonte: Elaborado pelo Chequeado com base na quantidade de interações no Twitter em torno de Braian Gallo, de 27 de outubro a 7 de novembro de 2019; utilizando a ferramenta Trendsmap.

Nos tuítes, as palavras mais recorrentes foram “mesa” (22%), “presidente” (21%), “todos” e “discriminação” (18%), “alberto” (17%). “Discriminado” estava presente em 8% das mensagens. Vale ressaltar que o uso dessas palavras não significa que o conteúdo seja ou não discriminatório (por exemplo, a frase “não foi discriminado” contém a palavra, mas vai na direção oposta).

A Lei 23.592 fornece proteção contra atos ou omissões discriminatórias com base em raça, religião, ideologia, opinião política, status econômico, condição social ou características físicas. No caso da Internet, qualquer conteúdo considerado discriminatório (foto, meme, comentário) pode ser comunicado ao INADI. Segundo o Instituto, o número de reclamações sobre o ambiente online tem uma tendência crescente: do total de casos recebidos pela agência, o percentual referente à Internet passou de 5% em 2008 para 35% em 2017. Metade das denúncias de discriminação online eram referentes a conteúdos publicados no Facebook e 5,6% no Twitter.

No período analisado, uma das hashtags mais bem classificadas no Twitter foi “#operaciongorrita” (“operação boné, com 5,1%), hashtag com a qual foram compartilhadas mensagens que duvidavam que Braian tivesse sido presidente de mesa, e apontavam o uso de um boné. Salientavam que ele não figurava entre os fiscais e que fazia parte de uma operação kirchnerista destinada a afetar os resultados das eleições.

Gallo foi presidente da mesa em Moreno, como consta nos registros eleitorais. Além disso, o Chequeado conseguiu provar que ele estava inscrito na lista oficial de fiscais desde as eleições primárias (PASO). Nos registros do Correio Argentino é informado que o pagamento como fiscal correspondente às eleições primárias já foi feito (ver aqui e aqui). Embora a comissão para as eleições de outubro ainda não esteja disponível, a Câmara Nacional Eleitoral confirmou a este meio de comunicação que a convocação para ser um fiscal de mesa e a lista oficial incluem as eleições primárias, as eleições gerais e um eventual segundo turno.

Outro ponto viralizado no Twitter enfatizava a militância de Gallo no Movimento Evita, dirigido por Emilio Pérsico, o que, segundo alguns usuários (veja aqui, aqui e aqui), o impediria de ser um fiscal de mesa. A prefeita eleita de Moreno pela Frente de Todos, Mariel Fernández, confirmou que Gallo “participa do nosso espaço político” e defendeu que ele foi convocado pela comissão eleitoral para ser um fiscal de mesa, como fez em outras ocasiões. Sobre isso, Gallo compartilhou com o Chequeado o telegrama enviado pelo Tribunal Federal Nº 1 com competência eleitoral no distrito da província de Buenos Aires que comprova a afirmação.

Fonte: imagem enviada por Gallo ao Chequeado.

O Código Eleitoral Nacional exige que os fiscais sejam qualificados para votar, sejam maiores de idade, residam onde vão trabalhar e saibam ler e escrever. Apesar disso, em 2007, a Câmara concordou em excluir da seleção “os eleitores que são filiados a algum grupo político”, exceto “quando há boas razões que justifiquem”. A razão era que os designados fossem independentes dos grupos políticos.

No caso de Gallo, além de sua militância, ele não está registrado em nenhum agrupamento do Registro Nacional de Afiliados a Partidos Políticos. A CNE até qualificou a exclusão pela filiação num acordo de 24 de outubro de 2019, dado que vários distritos “impedem a que a totalidade das mesas de voto seja composta por cidadãos que não sejam filiados e que ao mesmo tempo estejam devidamente capacitados”.

Outra hashtags muito utilizada na conversa foi “#agrietados” (“rachados”, hashtag proposta em 29 de outubro pelo Minuto Uno, o programa apresentado por Gustavo Sylvestre na C5N), que esteve presente em 4,2% dos tuítes. “#todossomosbrian” (“Todos somos Brian”, com 3%) e “#briansomostodos” (“Brian somos todos”, com 1,2%) foram as seguintes hashtags que fizeram parte do ranking das mais utilizadas. Ambas coincidiram com as palavras de Fernández, que disse em 29 de outubro, com um link para uma nota do Clarín, que “o país em breve vai deixar para trás o preconceito e a discriminação. Todos somos Brian”. Essa mensagem foi a mais retuitada sobre o assunto, com 23 mil compartilhamentos e salva mais de 100 mil vezes.

O segundo tuíte mais compartilhado também foi publicado pelo presidente eleito, após seu encontro com Gallo em seu escritório na Rua México, 300. “Me disseram que me juntar com ele ia soar oportunista. Se esta é uma oportunidade para deixarmos de lado nossos preconceitos, que ela seja bem vinda”, disse ele, ganhando 14.160 retuítes e mais de 77 mil curtidas. Na foto, Fernández foi visto usando o boné de Braian ao contrário, o que motivou memes e outras publicações.

A terceira mensagem mais compartilhada foi publicada pela conta @EriDai_A, que tem 219 seguidores e está ativa no Twitter desde 2010. O tuíte compartilhou o vídeo de um grupo de alunos do Colégio Emaús (uma instituição religiosa privada localizada em El Palomar) que foi gravado enquanto apontavam uma arma para um professor na sala de aula. “Vamos viralizar, vamos julgar como fizeram com #Brian, que seja feito igual independentemente da posição econômica”, propôs em seu tuíte, fazendo uma comparação entre os dois casos.

Finalmente, a conta que registrou mais atividade sobre este tema foi @EzequielSalasOk, que tem 9,6 mil seguidores. O usuário se descreve como “Aluno na UNT [Universidade Nacional de Tucumán]. Leitor. Opinólogo. Militante da realidade”, e registra atividade desde 2016. A segunda foi a já mencionada @EriDai_A, e o terceiro lugar no ranking foi ocupado por @Lautiroman1995, “Licenciado em Jornalismo” com atividade desde 2010 e 289 mil seguidores.

(*) O e-mail do Observatório da Internet do INADI é observatoriointernet@inadi.gob.ar. Se você sofreu um ato discriminatório na Internet, você pode entrar em contato com o INADI pelo telefone gratuito 0800-999-2345, através do site www.argentina.gob.ar/inadi ou pessoalmente na sede do Instituto (Avenida de Mayo 1401, Buenos Aires) ou nas 23 delegações provinciais de todo o país.

*A Sala de Democracia Digital é uma ação da FGV DAPP, em parceria com Chequeado, na Argentina, Linterna Verde, na Colômbia e Ojo Público, no Peru. Nós monitoramos o debate público nas redes sociais pela América Latina.

A análise original está disponível no site do Chequeado aqui.