Bolsonaro é responsabilizado por crise em território Yanomami e apoiadores associam caso a venezuelanos em defesa
Atualizado em 31 de janeiro, 2023 às 4:13 pm
- O campo progressista, que concentrou a maior parte dos perfis e interações sobre o tema no Twitter, argumenta que o governo Bolsonaro teve “genocídio indígena” como projeto. Ações de ex-ministros, como veto a leitos de UTI e água potável, se destacam;
- Perfis alinhados à extrema-direita oscilam entre tentar desresponsabilizar o ex-presidente Jair Bolsonaro pela crise humanitária – ao classificar os indígenas como venezuelanos, por exemplo – e mesmo a negar a existência dos Yanomamis.
Com mais de 70% dos perfis e interações no Twitter, o campo progressista dominou a discussão sobre a crise humanitária dos Yanomamis e responsabilizou enfaticamente o ex-presidente Jair Bolsonaro e ex-ministros de seu governo pela situação. É o que mostra levantamento da Escola de Comunicação da FGV, que analisou postagens sobre o tema no Twitter, Facebook e Telegram entre 20 e 25 de janeiro de 2023.
Na repercussão midiática, a tendência de proeminência do campo progressista no debate se repetiu: este somou quase metade dos links compartilhados no Facebook, frente a 12% de notícias sobre o tema oriundas de sites alinhados à extrema-direita. No entanto, narrativas conspiracionistas que tentam retirar a responsabilidade do ex-presidente Bolsonaro e chegam a negar a existência dos Yanomamis tiveram alta circulação no Telegram.
Mapa interações do debate sobre a crise humanitária em território Yanomami no Twitter
Período: de 20 a 25 de janeiro, até 12h
Fonte: Twitter | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
Esquerda (Vermelho) – 51,6% perfis | 69,0% interações
Formado por perfis de esquerda ligados ao governo @lulaoficial, como @andrejanonesadv, @nisia_trindade e @randolfeap, o grupo repercute a crise humanitária e responsabiliza o ex-presidente Bolsonaro e a ex-ministra Damares Alves por se omitirem diante do caso. Se destaca a notícia de que o governo teria ignorado 20 ofícios sobre o tema e a morte de 570 crianças por fome. Membros do governo também anunciam medidas do governo para enfrentar a crise e afirmam que o povo Yanomami não será mais ignorado pelo Estado Brasileiro.
Direita (Azul) – 23,0% perfis | 17,0% interações
Base de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, o grupo se divide entre lideranças políticas aliadas ao ex-presidente como a ex-ministra @damaresalves e o senador @flaviobolsonaro, defendendo o antigo governo e ressaltando medidas relacionadas à proteção de comunidades indígenas. A segunda narrativa liderada por @atrombeta3 de defesa do governo Bolsonaro afirma que os indígenas na realidade são venezuelanos e que a responsabilidade pela crise é do presidente Lula e Nicolás Maduro. De modo mais lateral, há ainda a narrativa de que as fotos são antigas e que Lula está fazendo uso político do caso.
Perfis progressistas (Laranja) – 21,1% perfis | 12,6% interações
Conjunto de perfis progressistas que denunciam a crise humanitária em território Yanomami e responsabilizam o governo Bolsonaro pelo caso. O grupo ressalta que o ex-presidente foi avisado sobre o caso e cobram “a turminha pró-vida” a se mobilizarem diante do caso. Eles ainda defendem que o caso seja tratado como um genocídio e fazem comparações com a Alemanha nazista. Se destacam os perfis: @lazarorosa25, @choquei, @drbrunogino.
Evolução do debate sobre temas ambientais associados a Lula e Bolsonaro no Twitter
Período: de 20 a 25 de janeiro
Fonte: Twitter | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
- Menções aos termos indígenas, garimpo, agronegócio e Amazônia tiveram consideravelmente mais associações com o ex-presidente Jair Bolsonaro do que com o atual presidente Lula. Nos respectivos picos de uso do termo indígenas, por exemplo, as associações com Bolsonaro foram três vezes maiores do que no caso de Lula – o que sugere, pelo volume e teor das mensagens, uma forte percepção de que o ex-mandatário é visto como diretamente ligado à instauração da crise humanitária dos Yanomamis;
- Nas associações com Bolsonaro, o termo indígenas é frequentemente associado a “genocida” e “assassino”, além de “miséria”, “desnutrição” e “garimpo ilegal”. No caso de Lula, as associações ao termo indígenas se concentraram nas ações do presidente para mitigar a crise humanitária e nas promessas de dar fim ao garimpo ilegal nos territórios indígenas;
- Os tuítes de maior repercussão classificaram a crise humanitária como um projeto de governo do ex-presidente e aliados, ao exemplo dos ex-ministros Damares Alves e Ricardo Salles e do ex-vice-presidente Hamilton Mourão;
- Críticas a ações da ex-ministra de Direitos Humanos no ano de 2020, após a eclosão da pandemia de Covid-19, tiveram alto alcance. Foram mencionados vetos a leitos de UTI, produtos de limpeza e higiene e material informativo sobre a pandemia, além de água potável destinada para a população indígena;
- Na base alinhada a Bolsonaro, argumenta-se que os indígenas em situação de vulnerabilidade extrema seriam venezuelanos. Com essa falsa afirmação, asseveram que o ex-presidente não poderia ser responsabilizado pela situação, mas sim o suposto “socialismo bolivariano” de Hugo Chávez e Lula.
Principais termos sobre a crise humanitária em território Yanomami no Twitter
Período: de 20 a 25 de janeiro
Fonte: Twitter | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
- Os tuítes de maior destaque corresponderam à ampla cobertura midiática em torno do tema e a reações de atores políticos do campo progressista, especialmente o presidente Lula e o deputado federal Guilherme Boulos. A morte de 570 crianças indígenas foi citada em grande parte das publicações;
- A divulgação de ações para mitigar a crise humanitária do povo Yanomami e a responsabilização do governo de Jair Bolsonaro pela crise foram ressaltadas, sobretudo em referência à facilitação do avanço do garimpo ilegal em territórios indígenas e ao boicote deliberado a agentes fiscalizadores;
- Reitera-se que Bolsonaro teria ignorado 21 pedidos de ajuda dos Yanomamis contra garimpeiros, o que foi refutado por seguidores do ex-presidente. Os perfis alinhados ao político ainda questionaram onde teriam estado as ONGs que se manifestam contra a tragédia e afirmaram que os indígenas seriam venezuelanos, o que tiraria de Bolsonaro a responsabilidade sobre eles;
- Ex-membros do primeiro escalão do governo Bolsonaro foram apontados pelo campo progressista como coniventes e/ou omissos com a tragédia, especialmente a ex-ministra de Direitos Humanos e atual senadora Damares Alves, o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, o ex-ministro da Saúde Marcelo Queiroga e o ex-presidente da Funai Marcelo Xavier. Vetos a leitos de UTI e água potável a indígenas foram alguns dos exemplos mencionados.
Mapa de links sobre debate sobre a crise humanitária em território Yanomami no Facebook
Período: de 20 a 25 de janeiro, até 12h
Fonte: Twitter | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
Mídia de esquerda (Vermelho) – 17,8% perfis
Formado por links de veículos de comunicação de esquerda, como Brasil de Fato, Blog da Cidadania, Diário do Centro do Mundo e Carta Capital, o grupo repercute conteúdos que responsabilizam o ex-presidente Bolsonaro e a ex-ministra Damares Alves pela crise humanitária em território Yanomami. Os links destacam a informação de que Bolsonaro ignorou 21 pedidos de ajuda e a visita de Lula a Roraima para acompanhar o caso e as medidas anunciadas pelo governo do petista. A mídia tradicional, com destaque para G1 e Uol Notícias, também repercute a situação dos indígenas através de relatos de profissionais enviados para ajuda humanitária.
Mídia local de esquerda (Amarelo) – 9,3% perfis
Com destaque de sites da região Norte, como Sumauma e BNC Amazonas, o grupo também responsabiliza o governo Bolsonaro, dando ênfase à situação dos indígenas e as mortes causadas pelo descaso do poder público. Nesse sentido, parte dos conteúdos afirmam que a inação do presidente foi proposital e que ele teria como objetivo o genocídio dos povos indígenas no Brasil.
Mídia progressistas independente (Laranja) – 8,3% perfis
Formado por portais de mídias progressistas, como a Revista Fórum, The Intercept Brasil e Jornal GGN, o grupo repercute links de matérias com declarações do presidente Lula e dos ex-presidentes Dilma e Bolsonaro sobre o caso. A possível relação da crise com o garimpo e críticas às lideranças do bolsonarismo por atribuírem a crise humanitária a uma farsa também têm alta circulação.
Mídia independente de direita (Azul) – 7,4% perfis
O conjunto circula links de portais independentes da direita associados ao ex-presidente Bolsonaro, como Poder DF e Agora Notícias Brasil. Os conteúdos afirmam que os indígenas em Roraima seriam venezuelanos, responsabilizando o presidente Lula e Nicolás Maduro. Ainda afirmam que o caso seria uma “farsa da esquerda” e que Lula estaria usando o caso a seu favor, se aproveitando do que seria uma tragédia.
Mídia tradicional (Verde) – 7,0% perfis
Conjunto de links de portais de mídias tradicionais, como G1, CNN Brasil e IG Último Segundo. O grupo repercute o descaso com a saúde da população Yanomami, destacando o trabalho do Ministério da Saúde de resgate a indígenas com desnutrição e malária, além de noticiar suposta falta de apoio do governo Bolsonaro na atenção à saúde no território.
Mídia alternativa de direita anti-bolsonarista (Roxo) – 4,5% perfis
Protagonizado pelo site O Antagonista, mas com a presença de outros portais não alinhados com a esquerda como DW Brasil, G1, Brasil de Fato e A Verdade, o conjunto repercute links que criticam Bolsonaro, dão destaque ao pedido de deputados petistas para o MPF investigar o ex-presidente e a ministra Damares e denunciam ONG Evangélica que recebia recursos da saúde indígena.
Telegram
Posts sobre a crise humanitária em território Yanomami no Telegram
Período: de 20 a 25 de janeiro
Fonte: Telegram | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV
- As narrativas em circulação em grupos de direita do Telegram oscilam entre desresponsabilizar o governo Bolsonaro pela crise de saúde dos Yanomami e a afirmação de que o governo Lula teria interesse em facilitar a entrada de ONGs estrangeiras nos territórios indígenas para obter vantagem financeira;
- O argumento mais frequente é que os yanomamis em situação de extrema vulnerabilidade estariam em território venezuelano e que, por essa razão, o ex-presidente Bolsonaro não poderia ser responsabilizado por sua condição de saúde. Tenta-se associar a tragédia a políticas públicas da esquerda na Venezuela, que são frequentemente comparadas às do PT;
- Filho do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro divulgou em seu canal oficial na plataforma um vídeo que acusa Lula e o PT de desenvolverem uma associação supostamente indevida entre o governo Bolsonaro e a crise de saúde dos Yanomamis. Em tom de ironia, fala-se que a esquerda estaria tentando responsabilizar Bolsonaro por uma situação anterior ao seu governo;
- Circulou em diferentes grupos um longo texto que defende que os Yanomamis se tratariam de uma tribo “inventada” por europeus. O argumento central é de que uma organização suíça teria inventado o referido grupo étnico para justificar a exploração indevida de recursos naturais. Fala-se ainda que a Reserva Yanomami deveria ser anulada através de intervenção militar.